Ao anunciar as medidas que tomaria contra as facções, o Secretário de Administração Penitenciária do Ceará, Luís Mauro Albuquerque, permitiu que as organizações criminosas reagissem para tentar intimidar o governo local.
Essa é a opinião do sociólogo e jornalista Francisco Amorim, que há vários anos pesquisa a queda de braço entre o Estado e o narcotráfico. Ele trabalhou por 13 anos como repórter policial e há oito anos se dedica a estudar a violência urbana e a dinâmica do narcotráfico na América Latina.
"O que me parece que houve no Ceará foi uma comunicação midiática de uma ação policial. Via de regra a ação policial se dá pela descrição e pelo processo efetivo, e não pelo anúncio. O anúncio tem um viés importante, mas se ele é feito em um momento equivocado tu geras esse tipo de reação", afirmou em entrevista à BBC News Brasil.
"Se você quer transferir, você transfere logo. Eu entendo a posição do secretário, mas toda vez que tu dizes 'eu vou isolar o líder', o líder sabendo que vai ser isolado já manda ordens."
A onda de violência no Ceará já registra ao menos 190 ataques em 43 municípios. O Estado recebeu o reforço da Força Nacional de Segurança, 309 suspeitos foram detidos e 35 detentos transferidos para prisões federais. Mesmo assim, as ações de facções criminosas continuam.
Os ataques começaram no dia 2 de janeiro, depois que o novo Secretário de Administração Penitenciária, Luís Mauro Albuquerque, anunciou que os presídios do Ceará não seriam mais divididos por facções e que a entrada de celulares seria fiscalizada com rigor. O governador do Ceará, Camilo Santana, disse na última quinta-feira que o Executivo não recuaria diante dos ataques.
Amorim, que é mestre e doutor em sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde integra o Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania, além de ser professor da Faculdade de Comunicação Social da UniRitter/Laureate Universities, passou um mês na Colômbia, nas cidades de Bogotá, Buenaventura, Cali e Medellín, um mês no México, em lugares como Cidade do México, Culiacán e Xalapa, e um mês no Rio de Janeiro para estudar o impacto das facções criminosas na vida dos moradores da periferia. O estudo, que deu origem à sua tese de doutorado, analisou também a cidade onde mora, Porto Alegre (RS).
Amorim alertou que o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), também estaria dando a possibilidade de as facções se prepararem.
O pesquisador afirma que há exemplos positivos de combate ao crime organizado, como o que ocorreu na cidade colombiana de Medellín. E que uma saída seria a melhor articulação entre a polícia Civil e a Federal.
Leia os principais trechos da entrevista com Francisco Amorim