Na última semana, o governo federal lançou uma nova seleção no âmbito do Novo Pac. A Portaria MCID 546/2025 é voltada ao eixo Água para todos na categoria abastecimento rural. A medida prevê aporte de R$ 400 milhões para financiar propostas de implementação de sistemas de abastecimento de água em áreas rurais. No entanto, apenas Estados poderão apresentar propostas por meio da Plataforma TransfereGov.
A Confederação Nacional de Municípios (CNM), com mais de 95% dos Municípios filiados, questiona a medida. Para a entidade, a exclusão dos Entes locais não encontra respaldo legal, já que eles são os titulares dos serviços de saneamento básico. Ainda que em alguns arranjos regionais os gestores municipais compartilhem a titularidade com os Estados, os Entes locais permanecem com a obrigação de implementar políticas públicas de saneamento básico.
Para a entidade, a restrição imposta fere a autonomia dos Municípios em acessar diretamente os recursos federais, ainda que tenham legitimidade legal e conhecimento da realidade local. Além disso, a medida contraria o disposto no Decreto 11.599/2023, que, em seu art. 15, dispensa até 31 de dezembro de 2025 o cumprimento dos incisos VII, VIII e IX do art. 50 da Lei 11.445/2007 como condição para acesso a recursos da União.
Entre os requisitos dispensados está, por exemplo, a adoção da prestação regionalizada, modelo instituído pelo Estado em que os Municípios passam a compartilhar a titularidade dos serviços de saneamento básico com o próprio Estado.
Não há, portanto, justificativa evidente para restringir a apresentação de propostas exclusivamente aos Estados, especialmente considerando que a exigência da regionalização para acessar recursos da União só passa a vigorar a partir de janeiro de 2026.
Pouco recurso para a alta demanda
Outro ponto questionado pela CNM é que o valor de R$ 400 milhões, previsto para a seleção, está muito aquém do necessário para enfrentar os desafios do abastecimento rural.
O montante, inclusive, é inferior aos danos e prejuízos registrados apenas em 2023, que somaram R$ 566 milhões com a Operação Carro-Pipa, conforme aponta o relatório de recomendações da Operação Carro-Pipa – Ciclo 2023-2024, elaborado pelo Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (CMap).
Em paralelo, a CNM destaca que as concessões e modelagens atualmente em curso, além das já licitadas, desconsideram as áreas rurais, concentrando os investimentos privados apenas nas zonas urbanas. Sendo assim, os Municípios, sem apoio técnico e financeiro, assumem sozinhos a responsabilidade pela expansão dos serviços nas áreas rurais de maior vulnerabilidade.
A Confederação alerta para a realidade enfrentada pelos Municípios no atendimento à população rural e reforça que os recursos federais, sejam onerosos ou não onerosos, seguem insuficientes frente à demanda existente.
Isso porque, estudo da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) sobre as necessidades de investimentos em saneamento rural aponta que seriam necessários mais de R$ 94 bilhões até 2038 para universalizar o abastecimento de água no meio rural, incluindo tanto os sistemas coletivos quanto às soluções individuais.
Diante disso, o valor de R$ 400 milhões previsto na seleção representa menos de 0,5% da necessidade total de investimentos, o que reforça a urgência de políticas públicas estruturantes com maior participação dos Municípios e disponibilização de recursos voltados ao saneamento rural.
Lista de Municípios prioritários
Por fim, a CNM ressalta que a seleção publicada pela Portaria está limitada a uma lista de 776 Municípios considerados prioritários.
Segundo informações divulgadas na página do PAC, a fonte utilizada para definição da lista foram os dados do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID), especificamente os Municípios que tiveram solicitações de recursos de assistência humanitária aprovadas para as metas “caminhão-pipa” e “galões de água” entre 2023 e 2024. Também foram incluídos os Municípios atendidos pela Operação Carro-Pipa no mesmo período.